quarta-feira, 30 de novembro de 2011

OS LOUCOS DA MINHA RUA









O ar que se respira, carbono negro, denso,

quase impuro, nada tem a ver com a cor,

nem com as guelras (do odor não me lembro),

vem da memória, dizes, talvez do coração,

pois nem o pulmão que o inspira, sente.

Assim se vão passando os dias, indolentes,

aqui no asilo, onde às árvores chamam gente,

e elas murmuram entre dentes, qualquer coisa,

que bem podia tratar-se de sementes.

Mas não, é coisa de doentes…



arlindo mota


domingo, 20 de novembro de 2011

ATÉ QUANDO?


Os filhos da urbe, apartam-nos; os lares que constroem para eles são verdadeiras estalagens para a derradeira vagem, sem açúcar, sem afecto; a sua reforma é inferior, na maior parte dos casos, ao valor das roupas de marca que os seus netos usam; o preço dos medicamentos que lhes prolongam a vida está pela hora da morte…

Resta-lhes, como na alegoria de Elio Vitorini, seguir o trilho dos elefantes, que se apartam da manada, quando sentem que a sua utilidade chegou ao fim, dirigindo-se para norte, gigantesco cemitério de elefantes: “Consideram-se mortos e morrem”, desistem de viver. Para quando a devolução da dignidade perdida dos mais velhos; até quando estes atravessarão o presente, desculpando-se de não ter ido mais longe”, nas palavras de Brel, e se sujeitam à tirania dos que esperam o seu sono tranquilo e infinito?


arlindo mota

foto: apm

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

MEDE A AMPULHETA O QUE SE SENTE?






























Se o orvalho cai generosamente,

tecendo um manto fresco e sedutor

que nos aproxima irresistivelmente,

mede a ampulheta o que se sente?


Muito já se disse sobre o tempo

- Eficaz tempero de alma ou desespero –

E, afinal, somos só navegadores.



arlindo mota

foto: apm

BOUTIQUE DOS RELÓGIOS PÚBLICOS




LISBOA Terminal do Rossio

foto: apm

terça-feira, 1 de novembro de 2011

MAR ADENTRO























Metódica, Cibele colhia a escassa chuva

na concha das suas mãos vazias.


Com os dedos esguios, habilmente, entrelaça-a,

pingo a pingo, como se fora um colar. Por fim,

esbelta e delicada, afoita-se, por entre o

agreste das aroeiras,mar adentro, oceano acabado

de lavrar.



arlindo mota