domingo, 30 de maio de 2010

CABO DA ESPERANÇA



Quanto custou dobrar o Cabo,

Assegurar os mantimentos

E o ânimo dos Homens?

País de marinheiros, de aventuras,

Ninguém pergunta quanto custa

Dobrar o cabo da ternura.


Dobrar o Cabo, sem perder a esperança

E ao sabor do vento navegar,

Indiferente à tempestade ou à bonança,

Ser uma ilha entre o azul e o mar.



arlindo mota

foto e poema

domingo, 23 de maio de 2010

FORA ASSIM QUE TUDO COMEÇARA...



Rios irrompiam bem por dentro

criando uma alameda junto ao mar

entre palmeiras e urzes inclinadas

que o vento modelava sem cessar.


Aí teu perfume de cedro e aloendro

anunciava um tempo mais bravio

enquanto as faces breves se tocavam

por entre camarinhas e o desejo.


Fora assim que tudo começara,

despojada candura e verdes campos:


Feliz, recorda Cibele, no seu semblante

a chegada de mais uma Primavera.



arlindo mota

foto e poema

domingo, 16 de maio de 2010

OS LOUCOS DA MINHA RUA




O ar que se respira, carbono negro, denso,

quase impuro, nada tem a ver com a cor,

nem com as guelras (do odor não me lembro),

vem da memória, dizes, talvez do coração,

pois nem o pulmão que o inspira, sente.

Assim se vão passando os dias, indolentes,

aqui no asilo, onde às árvores chamam gente,

e elas murmuram entre dentes, qualquer coisa,

que bem podia tratar-se de sementes.

Mas não, é coisa de doentes…



arlindo mota


foto de um quadro de Toni Puig

sábado, 8 de maio de 2010

A ESPADA DE DÂMOCLES


Era de Dâmocles a espada

que pendia,

embainhada,

só aparente o poder

de que gozava.

sentinela acutilante

de uma alma

vigiada,

cerceando-lhe os sonhos

que guardava,

intensos,

bem por dentro

das amarras,

no seu lado frágil

que sempre se dava

ardentemente.



Arlindo Mota
poema e foto

BILHETE POSTAL: CROMELEQUE DOS ALMENDRES


Situado a cerca de 12 km a poente da cidade de Évora, o Cromeleque dos Almendres integrava, no seu apogeu, mais de uma centena de monólitos, constituindo um recinto de estrutura complexa, fora dos cânones dos monumentos similares da Península, com paralelo apenas num pequeno universo no termo de Évora.
Apesar de se encontrar em região de forte presença de testemunhos funerários do complexo cultural megalítico, somente em 1964, no decurso dos trabalhos da Carta Geológica de Portugal, o arqueólogo Henrique Leonor Pina, identificou este recinto que constitui o maior conjunto de menires estruturados da Península Ibérica e um dos maiores da Europa. (Com a devida vénia do Turismo de Évora)

Foto: arlindo pato mota

sexta-feira, 7 de maio de 2010

EUFRÁZIO FILIPE: OCULTA NO GRASNAR DAS AVES



Os barcos ainda não tinham

abandonado o chão das águas

já vergavas o corpo

na corda tensa

enterravas os pés

e deixavas os peixes saltarem

nos teus olhos prateados

Exilada no próprio corpo

emerges deusa quase perfeita

ao pôr do sol

num desencontro de preces


mas só quando a desoras

te abres em flor e desnudas

entregas o resto das forças

a um beijo

adormeces oculta

no grasnar das aves

Eufrázio Filipe

Foto: Pedro Soares

"Em todo o livro (o recém-editado Para Lá do Azul), o autor estabelece um subtil diálogo, mais pressentido que nomeado, entre um eu e um tu onde se respira uma delicada sensualidade que percorre quase todos os poemas e onde as palavras vão serenamente, desenhando uma trignometria imperiosa dos sentidos." in Prefácio de Arlindo Pato Mota